G20_Enforcamentos Urbanos – Um Olhar para o Beco dos Aflitos

Entrega 4

A etapa final do trabalho consistiu na definição de uma linguagem comum e de um recorte temático específico para as fotografias, seguido de um processo editorial para a formação do livro intitulado Enforcamentos Urbanos – Um Olhar para o Beco dos Alfitos.

Iniciamos o processo de definição da linguagem e do recorte a partir de uma seleção mais criteriosa das fotos que causavam algum impacto em cada um de nós, sendo esse tanto claro e analítico ou mesmo subjetivo e sensível. Após essa seleção, começamos a trabalhar com as fotos relacionando-as umas com as outras e entendemos que ao realizar esse processo, conseguimos extrair as mais diferentes narrativas do local, narrativas essas que não respondem a uma linearidade clara, uma vez que a relação que nossos olhos traçam com a imagem é muito mais fluida do que a relação traçada com o texto, por exemplo.

Entendemos, portanto, que essa história seria contada de uma maneira muito mais particular de cada interlocutor do que de uma forma imposta e única, fornecida por nós, autores. Uma vez libertos da linearidade e de uma organização “racional” ou ortodoxa, conseguimos entender que o Beco dos Aflitos é justamente marcado por contrastes, oposições  que superam uma narrativa de “começo, meio e fim”.

Foi então que começamos a relacionar o dentro e fora, o sagrado e profano, o habitado e o inabitado. Tecnicamente: o plano aberto e o fechado, a sobreposição de planos e o plano único, o recortado e o enquadrado, o claro e o escuro, etc…

O resultado é um livro com imagens opostas, conflitantes e também complementares, que abrangem não uma única narrativa, mas a possibilidade de diversos olhares e interpretações de um mesmo local.

Enforcamentos Urbanos nos traz de volta para a história de Chaguinhas e ao passado de uma comunidade negra, marginalizada e periférica residente na região da Liberdade, ao mesmo tempo que nos remete ao presente e à tentativa, ainda hoje, dessas histórias se manterem vivas e (r)existirem numa cidade comandada pelo capital e a especulação imobiliária.

 

Entrega 3

Para esta nova etapa de trabalho nos propusemos a explorar a dinâmica do local investigado, o
Beco dos Aflitos, com uma nova abordagem, mais sensível, criativa, pessoal e artística: a fotografia. Essa ferramenta, muito diferente de mapeamentos rígidos como o GeoSampa e GGIZ, permite uma pesquisa que evidencia as diversas nuances, recortes e sutilezas do olhar.

Durante o processo de desenvolvimento dos ensaios fotográficos, cada integrante do grupo realizou uma deriva no local, para tentar captar suas diferentes relações, em períodos variados do dia. A partir dessa produção, pudemos reconhecer vários temas que poderíamos abordar e acrescentar nas nossas discussões. Foi extremamente importante interpretar cada fotografia, uma a uma, para que descobríssemos novas formas de captação visual e também de composição estética, mirando um repertório comum.

Entendemos também, a importância do processo para o desenvolvimento do trabalho, pois ficou claro que as fotos evoluíam conforme a prática. Gradualmente fomos ajustando os critérios que achávamos pertinentes para a composição das imagens, como por exemplo: a adoção do estilo de imagem em PB, que realça outros elementos formais que não a cor, possibilitando um outro olhar para a realidade.

Compreendemos que a conclusão do trabalho se dará a partir da formação de uma linguagem comum para as fotos, que consiga exprimir nosso olhar sobre o Beco dos Aflitos e a região da Liberdade. A ideia não é apenas registrar, mas conseguir trazer uma leitura particular e aplicada dessa realidade tão contrastada.

Pretendemos utilizar essa terceira banca também como laboratório, onde as fotos poderão ser comentadas por, além dos orientadores, outros grupos, incrementando nosso processo.

 

Entrega 2

“Pôde-se, pois, afirmar que foi no primeiro quartel deste século, mais acentuadamente que o bairro da liberdade adquiriu suas características geográficas. Posteriormente muitas outras modificações se fizeram, principalmente quando a Prefeitura Municipal partiu para uma política administrativa de construção de grandes avenidas e linhas metroviárias”     (p. 56, ‘Liberdade’ , 1979 )

Passada a primeira entrega, nesta, já com um tema e um objeto de estudo definidos, desenvolvemos levantamentos arquitetônicos da Capela dos Aflitos, analisando suas características materiais, “estilísticas”, formais e suas camadas de tempo, atuais e de memória. Entendemos que podemos utilizar a própria arquitetura da Capela como ponto de partida para contar a história tanto do bairro e seu desenvolvimento, quanto do próprio desenvolvimento da cidade de São Paulo, no que diz respeito à políticas de ocupação, grandes reformas urbanas, marginalização e centralidades.

Além de levantamentos arquitetônicos, realizamos um levantamento do entorno da Capela, o beco dos aflitos, lugar que como já denuncia o nome, é estreito, sem saída e que consegue em meio a um bairro tão recortado como o da Liberdade, manter características muito peculiares. No beco além da Capela, existem algumas lojas e restaurantes, mas a maioria de sua ocupação é feita na forma de depósitos, são fundos de lojas que dão frente à rua Galvão Bueno, ou à rua da Glória, tendo um fluxo muito caracterizado por entrada e saída de mercadorias.

Houve uma maior compreensão do contexto urbano do bairro tanto atual, quanto histórico, após a leitura e fichamento de um volume de livros voltado aos bairros de São Paulo, este no caso, pautando o bairro da liberdade com uma perspectiva ainda de 1979 (ano da edição) até a aglomeração e o desenvolvimento urbano deste espaço, em seus moldes atuais. No livro a autora ressalta características atribuídas ao bairro ao longo do tempo e a mudança de ocupação do solo. Neste mesmo solo já viveram tribos indígenas, depois grandes fazendeiros e barões da pequena, futura, grande São Paulo.

No final do século XIX e principalmente no primeiro quarto do século seguinte, o bairro da liberdade foi habitado por uma população local e também por imigrantes portugueses e italianos. Com o passar dos anos, conforme os avanços sociais e econômicos que a cidade vinha passando, houve uma transformação nos pólos da capital paulistana fazendo com que estas populações partissem para outros bairros da cidade, deixando neste território marcas de suas passagens , grandes casarões, vilas e sobrados.
Estas mesmas casas por hora foram se modificando surgindo as casas-pensões e cortiços, que variam entre quartos e cômodos com banheiros e lavanderias comuns entre os moradores, com aluguéis mais baratos em que estudantes da mocidade paulistana começaram a se instalar formando repúblicas. Estas moradias, muitas vezes provisórias, ‘de cômodos de desagradável aspecto’ eram ocupadas também por comerciários de lojas.

“O cronista Afonso Lomonaco relata que por volta de 1883 as pensões proliferavam no bairro da liberdade, principalmente nas ruas Assembléia, Liberdade e dos Estudantes.” (p. 153)

A colônia japonesa foi se estabelecendo no bairro a partir de 1939, quando os primeiros japoneses imigrantes começaram a instalar na rua Tabatinguera. Com a segunda grande guerra houve uma proibição governamental  das aglomerações em comunidades, razão pela qual dispersou a população japonesa do bairro para outras áreas de São Paulo (ex. Cotia, local da produção agrícola japonesa) “Entretanto a inauguração do `cine niterói`, especializado na apresentação de produções cinematográfica japonesa, passou a congregar novamente os nipônicos em torno de si. ” (p.107). A inauguração do cinema aconteceu em 1953, sendo este, só o primeiro de muitos outros que passaram a existir na região.

( p. 129, ‘Liberdade’ , 1979)

“A região do bairro da liberdade ‘É um pequeno mundo! A população antes diminuta e espraiada cresceu e se condensou, apinhando-se agora nas mesmas ruas do século passado (XIX) umas longas e tortuosas e outras pequeninas e estreitas e que já não mais comportam o afluxo de novos moradores e desenvolvimento atingido, embora tenha crescido abaixo da média do crescimento de São Paulo, na década de 1960/70, segundo IBGE'” (p.105).

 

Entrega 1

Recorte: Bairro da Liberdade.

Objeto de estudo: Igrejas centenárias do bairro da Liberdade e a Praça da Liberdade.

Objetivo: Realizar um estudo urbanístico, arquitetônico, etno e historiográfico da região da Liberdade, a fim de analisar os processos que resultaram no tipo de ocupação da área: entender de que modo as igrejas históricas da região foram perdendo seu protagonismo e influência, estudar os processos que tornaram o bairro um núcleo da população de origem oriental e tentar se aproximar dos diferentes grupos sociais que habitam a região.

Justificativa: À primeira vista, podemos ler o bairro da Liberdade como uma região tradicionalmente oriental de São Paulo. Porém, com um olhar mais aproximado, é possível se aferir que há uma grande multiplicidade cultural, arquitetônica, religiosa e social.

Esse é o caso do Beco e Capela de Nossa Senhora dos Aflitos (1º lugar de interesse – imagem 1). Espremido entre karaokês, papelarias, templos budistas e academias de karatê  há um resquício de história da cidade: um beco que trava uma luta de resistência diária contra a força da especulação imobiliária. A Capela, inaugurada em 1775 e tombada em 1978, se encontrava no centro do primeiro cemitério a céu aberto de São Paulo. Naquele tempo, os sepultamentos costumavam ocorrer no interior das igrejas, porém, ficavam excluídos os indigentes, os escravos, as prostitutas e os condenados pela justiça, que não poderiam ser enterrados em solo sagrado. Assim, o cemitério fora construído para atender a essa demanda, sendo desativado em 1858 com a inauguração do Cemitério da Consolação. Após sua desativação, a área do cemitério fora loteada e nela uma ocupação de caráter desordenado fora incorporada à área. Essa ocupação é um dos fatores que ajuda a conformar a especificidade do beco, que como o próprio nome sugere, é um corredor, de pouco uso e permanência, composto por costas de edifícios e pequenos comércios. Além da forma peculiar, o beco é envolto de um mistério místico, uma história que confunde religião, lenda urbana, fé e política:

Imagem 1 – Beco e Capela de Nossa Senhora dos Aflitos. Fonte: www.cultura.estadao.com.br/blogs/divirta-se/para-esta-sexta-feira-13-um-roteiro-de-lugares-com-historias-assustadoras/)

São Paulo, 1821, Largo da Forca. Francisco José das Chagas, Chaguinha, era condenado à forca por liderar uma rebelião entre os soldados, em busca de melhorias salariais. Chaguinha ficou preso por 3 dias em um quarto na Capela de Nossa Senhora dos Aflitos antes de ser encaminhado à sua execução. No Largo da Forca, diz a lenda que a corda rompeu três vezes, enquanto as pessoas gritavam “LIBERDADE” à Chaguinha, batizando assim, a atual praça e bairro da Liberdade. Na praça fora erguida uma cruz em homenagem ao soldado condenado e mais tarde, em 1887, foi construída a Capela de Santa Cruz das Almas dos Enforcados (2º lugar de interesse – imagem 2).

Imagem 2 – Capela de Santa Cruz das Almas dos Enforcados. Fonte: www. arquisp.org.br/regiaose/paroquias

Assim chegamos à resolução do último lugar: a Praça da Liberdade (3º lugar de interesse – imagem 3). Que projeto de cidade criou o desenho da Praça da Liberdade? Como ela dialoga com seu entorno? Qual a importância de uma praça no âmbito das diferentes manifestações populares de uma região?

Imagem 3 – Praça da liberdade. Fonte: www.obaoba.com.br

Entendemos, por fim, que a escolha de qualquer um dos locais apontados nos levará a ter a possibilidade de estudar a fundo o bairro da Liberdade e evidenciá-lo como uma região importante no imaginário de identidade da cidade de São Paulo.

Direcionamento: Como forma de direcionar o trabalho, levando em consideração a escolha de três locais diferentes, o grupo entende que o próprio processo levará a escolha de produtos fundamentais. Em todo caso, pretende-se, imediatamente, realizar um levantamento etnográfico da região da Liberdade, por meio de entrevistas, relatos, fotos e vídeos. É também de interesse produzir cartografias sociais e sensíveis, realizar levantamentos históricos e urbanísticos. A possibilidade de intervenção na região também não está descartada, de toda forma, acreditamos que para se propor uma intervenção, todas as análises acima mencionadas são de total uso e necessidade.