Entrega 1
No semestre passado o grupo encerrou o trabalho com dois produtos que foram feitos a partir de conversas com 11 mulheres vinculadas a movimentos de moradia: um áudio compilando todos os relatos e 3 diagramas que sintetizavam questões relevantes que foram levantadas.
Os diagramas foram uma importante ferramenta para entender toda a complexidade dos movimentos de moradia focado na luta das mulheres.
Durante o workshop, decidimos seguir com a linguagem do diagrama, mas focando na cozinha da ocupação 9 de julho. Esse trabalho nos evidenciou várias questões (ex: como a cozinha, espaço tradicionalmente de opressão para as mulheres, pode se tornar uma ferramenta de emancipação), mas ficamos intrigadas com a importância do papel da arte a partir da ação do Coletivo Aparelhamento (coletivo que organiza as atividades da cozinha).
Decidimos seguir o trabalho explorando a linguagem artística e a forma como ela pode atuar para evidenciar questões que foram coletadas no semestre passado.
Após olharmos para esse material que já havíamos levantado, acreditamos que usar uma intervenção artística para destacar a potência da voz das mulheres em locais específicos (na política, na luta e na academia) seja um caminho interessantes tanto de execução do trabalho quanto do resultado que ele pode atingir.
O objetivo é coletar áudios que foquem na inserção da voz da mulher nos três espaços já citados e também relatos dessas mesmas mulheres sobre como elas entendem a sua presença nesses locais. A partir desse material, o grupo vai fazer uma intervenção em cada um desses locais para destacar essa voz feminina e entender sua potência e, a partir da intervenção, entender qual a sua repercussão em cada ambiente.
Para a segunda entrega pretendemos coletar esses áudios e relatos que será a base para o desenvolvimento do trabalho. Na terceira entrega vamos focar no desenvolvimento do objeto artístico e pretendemos apresentar uma ideia preliminar. Na entrega final vamos apresentar as intervenções já realizadas e fazer um levantamento dos resultados obtidos.
Entrega 2
Somos 20 mulheres
Aqui dispostas
Juntas
E a partir desse encontro
Buscaremos celebrar a luta diária
Compartilhar nesse jantar
Estas individualidades
Para que a partir delas
Possamos entender o coletivo
Debater a voz como instrumento
E sua inserção na casa, na luta, na política
É o momento de ouvirmos
Da voz contar a própria história
E exalta-la como ferramenta de luta
Deixa-la fluir, expandir e ocupar.
Inseri-la em todos os espaços,
Desde a casa até a cidade.
Fazer dessa voz instrumento de intervenção
E lhe dar a responsabilidade
O dever
A liberdade
Dela se manifestar.
Não seria justo que a nossa própria voz tivesse autonomia de nos representar?
Buscar construir uma narrativa coletiva e, com isso,
Exaltar o protagonismo da fala
Entrega 3
1)TRABALHO SEMESTRE PASSADO
No semestre passado, a proposta do trabalho era entender a história da luta por moradia em São Paulo a partir da perspectiva de gênero. Sendo as mulheres que majoritariamente participam dos movimentos de moradia, o objetivo era investigar como se dão as relações entre as disputas de território, gênero e política. Para tanto, foram realizadas onze entrevistas e com base nelas foram feitos três diagramas e um áudio.
O intuito desses diagramas era compreender a participação feminina nos debates sobre habitação ao longo tempo, seu crescimento e as influências entre as mulheres em diferentes épocas e campos de atuação. Para além de um panorama geral, que relaciona as políticas habitacionais, as gestões e o papel dos movimentos de moradia, a ideia era mapear essa teia de influências entre as mulheres. Pensar nesses debates no âmbito doméstico, em relação ao papel de gênero assumido pela mulher dentro da casa, e como isso veio se transformando ao longo dos anos também foi de interesse do grupo. E, nesse sentido, refletir sobre esses espaços que as mulheres estavam criando e conquistando na cidade.
O primeiro diagrama, o temporal, para além de um panorama geral que relaciona as políticas habitacionais, as gestões e o papel dos movimentos de moradia, pretende apresentar o mapeamento dessa teia de influências. Essa teia foi conformada a partir das entrevistas, na qual perguntávamos quais tinham sido as referências femininas de suas trajetórias. Ao organizar as mulheres a partir de marcos importantes de sua trajetória, é possível realizar duas leituras desse diagrama. Uma horizontal, relacionando as mulheres com os governos e programas realizados em uma mesma época, e outra vertical, conectando-as entre si em períodos distintos. Ao realizar essa leitura horizontal, é possível perceber como mulheres em diferentes campos de atuação estavam conectadas, por exemplo: durante a gestão da Erundina (1989 – 1992), foi desenvolvido o CEDEC (Centro de desenvolvimento comunitário), cujo objetivo era pensar em equipamentos públicos sociais urbanos, principalmente escolas nos projetos de urbanização de favelas. A arquiteta Mayumi Wantanabe teve um papel importante na construção desse programa, pensando na produção de componentes construtivos pré-moldados em argamassa armada. Importante ressaltar nesse diagrama a ebulição dos movimentos de moradia a partir da década de 1980 e, com isso, o protagonismo das lideranças femininas.
No segundo diagrama, o geográfico , a ideia era cruzar as infraestruturas de transporte urbano (metro e trem), de saúde e educação (UBS e hospitais; creches e escolas primárias), com o lugar de moradia das entrevistadas. A ideia inicial era obter a partir desse diagrama uma análise espacial da cidade que reproduzisse as dicotomias entre centro e periferia. O resultado, porém, foi outro. Ficou evidente que apenas a quantificação dos equipamentos públicos não é suficiente para realizar essa análise urbana. Para além da qualificação desses espaços, ou seja, a quantidade de alunos que essas escolas atendem, se estão abertas, qual a frequência dos alunos e o mesmo para os equipamentos de saúde, compreendemos que seria necessário outros critérios e metodologias para realizar uma leitura de gênero da cidade. Nesse sentido, investigar quais são esses critérios e quais seriam as possíveis políticas públicas pensando na cidade para as mulheres.
Por fim, a ideia desse último diagrama, o das palavras, surgiu de uma das entrevistas, quando a Marisa, primeira coordenadora da Leste-1 disse: “(…) de valorizar cada uma para que ela entender o espaço muito importante participativo e também de construção dentro de casa e dentro do movimento”. O intuito é compreender as relações entre os ideários de habitação e as concepções de família, sexualidade, práticas sociais, sentimentos e símbolos, a atuação das mulheres nas políticas habitacionais, procurando entender com isso vem se transformando ao longo dos anos. Partindo do pressuposto que essas conquistas não ocorrem de maneira linear e homogênea, o objetivo desse diagrama é, a partir dos relatos de transformação pessoal das entrevistadas, mapear as permanências e transformações ocorridas tanto no âmbito da luta, ou seja, a efetiva participação feminina dentro dos movimentos por políticas habitacionais, como no âmbito doméstico, que engloba o papel de gênero que a mulher assume dentro da casa. E, nesse sentido, refletir sobre os espaços que essas mulheres estão criando na cidade. Com base em perguntas sobre quais foram as transformações ocorridas dentro da casa e da luta, foram elencadas palavras-chaves do discurso de cada uma.
O caráter político e de formação de cidadania dos movimentos e assessorias indicou que grande parte das transformações ocorridas foram nesse âmbito. A ideia de pensar em um projeto coletivo e colaborativo de comunidade foi mencionado com frequência durante as entrevistas.
WORKSHOP:
Recentemente tem sido realizados vários eventos, desde shows musicais à almoços promovidos pela cozinha da ocupação 9 de julho e, por isso, surgiu o interesse de estudarmos esse espaço durante essa semana. Articulando as questões econômicas, culturais e de visibilidade e imagem, buscamos entender o que significa essa cozinha, criada pelo coletivo Aparelhamento no início de 2017. A partir de uma conversa durante essa semana com uma das integrantes desse coletivo, Laura Maringoni, foi realizado esse diagrama sintetizando as principais questões. O aparelhamento é um coletivo criado em 2016, que se organizou depois do golpe e atua politicamente em vários lugares do Brasil. Com o intuito de desconstruir a imagem negativa que as ocupações carregam, surgiu a proposta da construção de uma cozinha coletiva que ofereceria um almoço mensal aberto para o público geral. A cozinha seria usada para fins do movimento, MSTC, com um sistema cooperativo, no qual o dinheiro arrecadado seria dividido entre aqueles que trabalharam no evento. O coletivo não é remunerado e a ideia e reverter a verba para o próprio movimento. Para além de arrecadar dinheiro, o objetivo é desenvolver cursos de capacitação para as pessoas que moram na ocupação, pensando em como elas poderiam gerar renda nesse espaço.
Entendendo que o instagram e o facebook são ferramentas importantes de divulgação da cozinha da ocupação 9 de julho, sendo que o último evento do domingo passado teve 1,5 mil interessados no evento, podem ser considerados novas formas de se pensar o ativismo político. Além de exercer uma função importante na mobilização da opinião pública, é um registro e memória dos acontecimentos, pensando em uma possível reintegração de posse. Também interessante notar as diferenças entre o material publicado pelas redes sociais da própria cozinha e o das pessoas de fora que frequentam esses eventos.
2) PREPARAÇÃO PROCESSO
ESPAÇO DE DIÁLOGO
A complexidade dos desafios atuais demanda que busquemos soluções por meio do engajamento e debate. Ao analisarmos a situação da democracia no Brasil e no mundo fica evidente a necessidade de uma cultura mais participativa, em que as várias camadas sociais contribuam para a construção de uma sociedade mais justa e fomente o diálogo em torno das questões sociais prementes.
Dentre os vários problemas que nos atingem, a maioria permanece inerte as autoridades, estagnando questões que nos causam forte impacto há séculos, tais como acesso à moradia, educação, saúde, o direito à cidade e a desigualdade de gênero.
A conversa e o diálogo, assim como o trabalho coletivo são habilidades antigas que historicamente contribuem para a superação de desafios através da fala e escuta. Contudo, é necessário perceber, que há um silenciamento histórico das minorias pelos grupos privilegiados. O lugar de fala é essencial para expressar as singularidades e o direito de existir. É essencial que em um espaço de diálogo exista o respeito às diferentes identidades coletivas e que cada um fale por si, como protagonista da própria luta.
Após a etapa de entrevistas do nosso trabalho, com mulheres de diferentes formações e com várias entradas quanto ao grande tema da moradia, ficou evidente para nós a força que existe na trajetória pessoal de cada uma e a potência da voz feminina atuando e reverberando politicamente na cidade. Um dos temas que norteou a conversa com as entrevistadas foi: mulheres que a inspiraram e influenciaram suas trajetórias pessoais, assim entrelaçando uma rede potente de mulheres que mesmo espacialmente distantes, conformam um quadro de conquistas na cidade.
Partindo da ideia de uma ação concreta e dentro do tema do Estúdio Vertical 2019: “Ainda o direito à cidade?”, convidamos para um encontro, além das 11 entrevistadas, mais 9 mulheres citadas que consideramos fundamentais na rede de mulheres que estruturam esse tema.
O evento Boca Livre têm como objetivo promover um espaço de diálogo e troca, e que possibilite o encontro e reencontro de mulheres que estão transgredindo os papéis normalmente atribuídos a elas, sendo essas protagonistas no seu espaço de luta. O encontro é a celebração da voz individual e coletiva e o fortalecimento de laços já estabelecidos.
- CONVIDADAS (confirmadas) bix
Lenir
Toninha
Ana Cristina
Salomé
Maria Eulina Hilsenbeck
Maria Eulina conhece, e bem, cada uma das ruas do Centro de São Paulo, de onde tirou a lição do que é ser uma voluntária. Aprendizado de dor e surpresas. Aos 20 anos, abandonou a sua cidade natal, São José dos Basílios, interior do Maranhão, terra onde nasceu e virou normalista. Como todos os jovens do norte e nordeste, na expectativa de uma vida diferente, veio à São Paulo e, por não estar preparada para a vida em uma cidade grande e não ter tido nenhum tipo de apoio, acabou morando nas ruas por 1 ano e 7 meses. Por quase dois anos, o endereço foi o mesmo: Parque Dom Pedro. Quando saiu das ruas, a primeira coisa que queria fazer era ajudar seus iguais. Por diversos anos Maria Eulina trabalhou como voluntária em diversas regiões carente na grande São Paulo. Em 1993 fundou a Oficina Profissionalizante Clube de Mães do Brasil, assim, passou a cuidar de pessoas que se encontravam nas ruas e queriam uma oportunidade para se erguer novamente. Isso fez com que a mesma ampliasse ainda mais seu olhar, principalmente na reconstrução dessas vidas, dando condições para que os mesmos pudessem se erguer, não somente pela comida e moradia, mas com cursos profissionalizantes, que dariam mais caminhos para a conquista de seus ideais.
Carmem Silva
Entrou no movimento na década de 90 por necessidade e assim percebeu que não era a única. É a atual líder do MSTC ( movimento sem terra do centro) e busca sempre coletivizar a luta.Hoje cumpre o papel de organizar e informar o maior número possível de trabalhadores de menor renda para que saibam de seus direitos e juntos o conquistem. Porque a luta por habitação não se limita somente à moradia, também tem que incluir saúde, educação, esporte…
Lucimara da Rosario Santos
Filiada ao movimento sem terra Leste 1, à União dos movimentos de Moradia e à CMP.
Participou do primeiro conjunto habitacional em São paulo em 1989 realizado através de mutirão, o Jardim São Francisco, no qual mora até hoje. Foi coordenadora da União Nacional, estadual, e coordenadora executiva do Movimento Sem Terra Leste 1. Atualmente está afastada por questões de saúde , mas continua batalhando pela conscientização das famílias da luta.
Kaya
Mestra pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP/2014), na área de Habitat. Possui graduação em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP/2008) e especialização na mesma Universidade em Economia Solidária e Tecnologia Social na América Latina (UNICAMP/2011). Atualmente é integrante da USINA – centro de trabalhos para o ambiente habitado, entidade sem fins lucrativos que presta assessoria técnica a movimentos populares na área de habitação popular e reforma urbana.
Maria das Graças de Jesus Xavier
Bacharel em Direito com especialização em Políticas públicas e direito Humanos. Coordenação Executiva da União dos movimentos de moradia e União Nacional Por Moradia Popular. Vice Presidenta do CONDEPE. É reconhecida pela Felow Ashoka como parte da rede dos principais empreendedores sociais do mundo.
Cleonice Dias dos Santos Hein
Estudante de doutorado pela PUC/SP, Bolsista CNPQ. Mestra em Serviço Social pela PUC/SP. Possui graduação em serviço social pelo Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (2008).
Atua há 10 anos na assessoria técnica Ambiente Arquitetura, como assistente social na realização do trabalho social a movimentos de moradia em projetos de Habitação de Interesse Social na modalidade autogestão com mutirão.
Atua ainda no projeto de “Capacitação de Lideranças” com a União dos movimentos de moradia de São Paulo.
Angela Amaral
Mestrado em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade de São Paulo (2001), Arquiteta e Urbanista pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da PUCC-Campinas (1978). Trabalhou na Prefeitura de Taboão da Serra onde foi Secretária de Desenvolvimento Urbano, Meio Ambiente e Habitação. Foi assessora técnica do Vereador Nabil Bonduki na Câmara Municipal de São Paulo na área de Habitação e pesquisadora no Projeto Metodologia de Avaliação de empreendimentos de Habitação e Saneamento na USP/São Carlos.Trabalhou na Prefeitura de Santo André, na Assessoria do Departamento de Controle Urbano da Secretaria de Planejamento e Habitação, na Prefeitura de Diadema, foi Diretora de Habitação da Secretaria e Planejamento e Habitação, na COHAB de Santos na Coordenação do Planejamento Habitacional e na Prefeitura de São Paulo na Superintendência de Habitação, na Coordenação do Programa FUNAPS Comunitário. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo com ênfase em Gestão Democrática com Participação Popular.
Paula Santtoro
Graduada pela FAUUSP (1997), mestre em Estruturas Ambientais Urbanas – FAUUSP (2004) e doutora em Habitat – FAUUSP (2008-2012). Foi Assistente Técnica do Ministério Público do Estado de São Paulo nos temas Habitação, Urbanismo e Meio Ambiente (2011-2013). Foi pesquisadora do Instituto Pólis (2001-2011), do Instituto Socioambiental – ISA (2007-2008) e do Laboratório de Urbanismo da Metrópole – LUME FAUUSP (2001). Em 2009 trabalhou na cooperação brasileira com o Governo de Moçambique para elaboração da Política Nacional de Habitação. Foi coordenadora editorial das publicações do Pólis entre 2002-2007. Tem experiência na área de Arquitetura e Urbanismo, atuando principalmente nos seguintes temas: Plano Diretor, Planejamento Territorial, Meio Ambiente, Urbanismo, Plano Urbano, Gestão Social da Valorização da Terra, Gênero, Mobilidade Urbana, espaço público/ comum.
Beatriz Bezerra Tone
É arquiteta e urbanista graduada na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, mestre e doutora
pela mesma instituição na área Questões fundiárias e imobiliárias,
moradia social e meio ambiente. Atualmente, é professora nos cursos de Arquitetura e Urbanismo, Engenharia Civil e Técnico em Edificações no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de São Paulo e no curso de Arquitetura e Urbanismo da Universidade São Judas Tadeu.
Entre 2001 e 2012 foi integrante da USINA CTAH (Centro de Trabalhos
para o Ambiente Habitado), assessoria técnica interdisciplinar fundada
em 1991 em São Paulo, SP, Brasil. A USINA atua articulando projeto,
planejamento, construção e gestão da habitação e de equipamentos
públicos na perspectiva do direito à cidade. Dentre os trabalhos que
desenvolveu nessa instituição estão o Mutirão Paulo Freire e o Mutirão
Comuna da Terra Dom Tomás Balduíno.
Ana Carolina Tonetti
Arquiteta, mestre em Projeto, Espaço e Cultura pela FAU-USP (2013) e doutoranda no mesmo programa. É professora na Escola da Cidade desde 2004, onde a partir de 2013 passou a coordenar a sequência de disciplinas voltadas aos meios de expressão e ao desenho. Articula diferentes parcerias e estratégias de ação em projetos com escalas e temporalidades distintas, aproximando arte e arquitetura, teoria e prática. Sua produção volta-se tanto para a prática artística como para projetos arquitetônicos.
Marta Moreira
Graduada na FAUUSP – Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo, 1987. É professora da Escola da Cidade, São Paulo, desde 2001. Foi professora visitante da Facultad Arquitectura y Diseño de la Universidad Finis Terrae, Santiago, Chile, 2013, e professora da Universidade Braz Cubas, Mogi da Cruzes, 1992 a 1995. É vice presidente da Associação de Ensino Escola da Cidade.
C.DISPOSITIVO
Assim como uma rede, a permeação e conexão heterogênea do dispositivo dialoga diretamente com a subjetivação. Sua intencionalidade perpassa uma reflexão, englobada pelos discursos, instituições, segurança, proposições filosóficas…
Sua capacidade estratégica, busca a elaboração do urgente. O interlocutor, como um dos idealizadores desse processo desempenhará a reflexão sobre o que lhe é levantada, utilizando-se de seu repertório. Como uma rede, esse discurso não é algo que se constrói só. Suas amarrações envolvem uma elaboração múltipla, ou seja, a conjunção de mais de um protagonista para haver um debate.
Assim o dispositivo pode-se resumir através da etapa da propulsão, internalização e externalização, no formato de discussão. Destacando que o último tem sua potência atrelada ao seu caráter de infinitude, por sua constante reelaboração após o encontro.
A partir dessa conceituação, o dispositivo criado no trabalho busca validar ao máximo a voz das convidadas. Tendo em vista a complexidade política atual e a trajetória pessoal de cada uma delas, a elaboração desse espaço realça a necessidade de vínculos que buscam um propósito comum. Dessa forma, o debate desempenha a função de fortalecimento da mulher, tanto disputa por espaços na cidade quanto na construção desse corpo conectado.
MESA
O círculo é a forma mais fundamental dos humanos se organizarem para uma conversa coletiva, em nível essencial, é uma forma que permite que os grupos pensem coletivamente. Quando praticado integralmente, funciona como uma incorporação física das raízes da palavra diálogo: “significado que flui através de. ”
A mesa redonda reforça a ideia de uma discussão horizontal, que não reproduza a lógica de poder e hierarquia vigentes na nossa sociedade. Sua forma proporciona o contato visual o desempenha o papel crucial de um ritual democrático que celebra o valor comum de estar juntas.
Para além, da configuração, tomamos a ideia de círculo como método processual e não apenas um dispositivo físico, primeiro com o princípio de que não existe uma liderança única e sim rotativa entre os membros presentes, segundo por mais que exista anfitriãs garantindo a fluidez das fases e intenções do encontro entendemos que a qualidade da experiência é compartilhada; e terceiro, apesar das agendas pessoais existe um propósito comum dentro do círculo.
CONFIGURAÇÃO MESA
TOALHA DE MESA
- COMIDA
Elemento chave para o desenrolar das dinâmicas, a comida é fundamental para a compreensão do que o almoço propõe. Nesse contexto ela deve ter sua interpretação ampliada para além do ato da celebração, mas atingindo também a esfera política, social, econômica, pessoal e coletiva.
O ato de comer, bem como o próprio alimento, apesar de estar presente constantemente em nossa rotina, vem sendo subjugado e limitado pela condição social domesticada em que nós estamos inseridos. A medida em que a grande produção agrícola se aproxima de uma monocultura extensiva, estamos nos submetendo a uma redução significativa daquilo que “nos é permitido ingerir” e, com isso, limitando essa experiência e troca com a natureza.
Buscando se refugiar dessa condição domesticada, Jorge Menna Barreto tem seu trabalho “Restauro” voltado para a conscientização do ato político de se alimentar, propondo “uma experiência de metabolização e digestão, tanto física quanto mental.” (BARRETO)
Uma referência fundamental para a compreensão conceitual do que o artista defende está no texto “Uma introdução ao pensar como uma floresta” de Dion Workman, que foi traduzido para o português pelo próprio Jorge Menna Barreto. Esse texto apresenta para o leitor conceitos como “Permacultura Feral” e “Resselvagização”.
Permacultura Feral é um sistema para vida sustentável não domesticada ou incivilizada, em ambiente resselvagiados/ projetar a incivilização. É unir o desejo da Permacultura de um padrão de vida sustentável a um estado de “desenvolvimento da civilização” com base na realidade presente. Mas do que um “retorno ao passado” é interpretar a forma como a “sociedade desenvolvida” tem lidado tanto com crises contemporâneas, sociais e ecológicas, como com a questão da alimentação e do cultivo de comidas. Fica evidente que quanto mais a agricultura se desenvolve vislumbrando o lucro, menos as necessidades fisiológicas humanas vem sendo atendidas.
Nesse sentido, o conceito de Permacultura Feral encontra a “Resselvagização”. É necessário que a sociedade liberte-se do estado domesticado que ela mesmo se impôs e se libertar para uma busca mais selvagem de sua própria condição. Nesse sentido, essa libertação nos permite novas experimentações e, no contexto da alimentação, dar liberdade para que os vegetais, frutos, verduras, se desenvolvam livremente só tende a ampliar a oferta de alimentos para nós mesmos.
“Nosso ambiente ideal, o ambiente em que evoluímos como espécie, é um ambiente arborizado e folhoso. Seu aroma é de húmus e fungos, ervas aromáticas e flores. É verde. Profundo, verde profundo. Neste ambiente, vivíamos de forma sustentável – não apenas de forma sustentável, nós realmente florescemos, proliferando culturas ricas e diversas por centenas de milhares de anos, Era um ambiente no qual presentes para o nosso sustento fluíam. Escassez, conceitualmente e como uma realidade física recorrente, aparece à medida que no desviamos do nosso ambiente ideal.” – (WORKMAN. P.09-10)
Nesse contexto que tem se desenvolvido o contexto de agrofloresta. Essa é uma forma de cultivar os alimentos em terrenos que se configuram como pequenas florestas. Assim, permite-se que exista uma contribuição de uma espécie em relação a outra, permitindo um desenvolvimento coletivo dessas espécies.
“(…)o modo de vida que estes jardins florestais fornecem é seguro, saudável, cooperativo, construtivo e criativo. Esta é a verdadeira liberdade. O jardim florestal familiar é a unidade básica da sociedade, ele oferece educação prática para as crianças e uma vida feliz, em grande parte livre de constrangimentos burocráticos, políticos ou econômicos.” (HART em relação aos jardins florestais e Kerala, na índia).
Na União Vila Nova, em um local chamado de Viveiro-Escola que um grupo de mulheres agrícolas desenvolve seu trabalho. As Mulheres do GAU se definem como: “mulheres imigrantes nordestinas que trabalham como agricultoras no Viveiro Escola União de Vila Nova, onde desenvolvem a manutenção do local baseadas em conceitos de permacultura através de plantio, cultivo, colheita e manejo agroflorestal. Em paralelo desenvolvem produtos alimentícios com base na culinária orgânica servindo cafés, almoços e coffee breaks (também abrangendo a culinária vegana).”
As atividades do grupo tiveram início quando houve o processo de urbanização do bairro e, por conta de uma solicitação populacional, deixaram disponível o lote do Viveiro Escola para áreas verdes. Depois de cuidados específicos para a melhoria da condição do terreno, elas começaram a plantar e cuidar dos alimentos com base no conceito de agrofloresta.
Visando aumentar o lucro, que até então era muito baixo, elas começaram a ver a cozinha como uma oportunidade de expansão do negócio. Suas origens nordestinas foram fundamentais nesse processo, já que a bagagem familiar e cultural foram exploradas em suas atividades. Isso fica evidente quando observamos o rico cardápio que elas oferecem.
A parceria das Mulheres do GAU para o desenvolvimento desse almoço nos foi fundamental pois elas realizam a transposição dos conceitos que viemos estudando para a prática desde o cultivo até o ato de comer.
É nesse momento que em conjunto com a evocação dos sentidos e processos digestives, buscaremos fazer com que as trajetórias pessoais das mulheres convidadas passem a ser coletivas, em um processo conjunto de trocas, união e celebração.
.entrada: suco folha de seriguela com limão + peixinho empanado
.salada: salada de hortaliças flores e PANC’s + / ou vinagrete de mangará
.prato principal: moqueca de banana pão + arroz branco com couve + refogado x + polenta de ragu com PANC’s + farofa de cuscuz
.bebidas: suco de limão, vinho branco e água
.sobremesa: sorbet de manga + bolo + café
3) EVENTO
DINÂMICAS
–Chegada: Espaço de mediação espontânea, acontece a primeira aproximação entre as convidadas. Onde se pode tomar um suco aromático, petiscar e conversar despretensiosamente, consultando o material produzido no semestre anterior, colados na parede.
Comida: entrada
–Acolhida: Momento de transição,que promove o deslocamento integral das convidadas para a mesa de almoço, atração promovida por um vídeo/áudio de um discurso de Marielle Franco – disparador áudio 1.
–Auto iniciação grupo+convidadas; explicar interação mesa: trazer a voz de cada uma para o ambiente onde o grupo está reunido. Assim, cada mulher tem a oportunidade de se apresentar, adicionando uma reflexão ou paralelo de sua trajetória pessoal com o vídeo.
Seguido por uma apresentação da proposta do almoço e compartilhamento de expectativas.Dinâmica destinada à introdução da reunião,aproximação das convidadas e compartilhamento de comentários críticos, iniciando a conversa.
Comida: salada
-Acordos + apresentação idéia comida: Criar coletivamente um acordo de como funcionará o encontro, definindo um ponto comum na abertura de cada uma no processo de troca. Trata-se sobre como e quanto querem estar juntas (ouvir sem julgar, oferecer o que pode e pedir o que precisa, silêncio também faz parte da conversa). Quando concluído o acordo, o grupo Mulheres da Gal fará uma introdução do coletivo: como se fundaram, onde atuam e quais são os ideais.
Comida: prato principal
– Transformação pessoal: Abertura da conversa para o âmbito mais íntimo, levantando troca de experiências, sentimentos e perspectivas. Os disparadores poderão surgir em forma de perguntas ou conectores dentro de conversas já existentes. Dentre elas estão: Como a sua participação nos movimentos de moradia influencia no seu crescimento pessoal? Por que há tantas mulheres no movimento de moradia? Você já enfrentou alguma dificuldade por ser mulher?
Comida: prato principal
-Despedida: Por fim, a troca de experiências do encontro em tom conclusivo. Compartilhamento de como estão saindo, o que foi absorvido, como se sentem sobre o que veio à tona e o que avança para a vida pessoal após o encontro. Abertura da fala se quiserem averiguar sobre a escolha do nome das mulheres que a inspiraram, estando ou não na teia. Seguido de um fala do grupo sobre o evento, enaltecendo a presença de todas e a alegria dessa conexão desse corpo de mulheres.
Comida: sobremesa
.Infraestrutura/ registro
-sonoro
2 Tascam
-visual
2 Caixa de som
1Projetor
1Gopro
4)DIGESTIVO
(pos almoco)
BIBLIOGRAFIA
-BOJER, Marianne; ROEHL, Eiko; KNUTH, Marianne e MAGNER, Collen “Mapeando Diálogos”
-AGAMBEN,Giorgio “O que é contemporâneo? e outros ensaios”
-Banquete de Platão
WORKMAN. Dion. “Uma introdução ao pensar como uma floresta”. Tradução: Jorge Menna Barreto. Disponível em: <http://files.cargocollective.com/556035/FLORESTA.pd>. Acesso em: 13/05/2019