1ª Etapa
O interesse do grupo a partir da proposta apresentada, era estudar referências onde elementos ou projetos contivessem em si a dualidade do tema proposto. O processo permeou-se através de inúmeras referências trazidas pelos membros do grupo em que essa situação era latente em diversas linguagens e aspectos.
A partir dessa leitura, percebemos que em muitas delas essa relação era estabelecida a partir de um elemento essencial e muito presente em diversas manifestações cotidianas – a água – e que esse próprio elemento continha em si a dualidade sempre presente, seja por seu próprio uso ou opressão do mesmo, pelo seu movimento, por sua falta ou abundância, e principalmente pelo seu provocado distanciamento do contexto da vida urbana.
Nos questionamos, assim, a pertinência de trabalhar, nessa primeira etapa, o elemento água e a maneira como essa adição e subtração se apresenta no meio urbano. Passamos a pesquisar referências de projetos que tiveram um tratamento nesse sentido. Em um segundo momento mapeamos situações na cidade de São Paulo que traziam em seu contexto essa relação a partir da água e começamos a questionar também a possibilidade de sugerir um novo tratamento para a situação existente em contextos como rios canalizados, piscinões, áreas alagáveis, as próprias várzeas dos rios e também os rios que estão presentes no meio urbano, mas que não podem ser usados pela população. Em todas essas situações é notória uma série de problemáticas provindas da ocupação opressiva da natureza pela sociedade no seu contexto urbano.
Em nossa estratégia de trabalho, pensamos em mapear situações como as citadas acima dentro de São Paulo, e trabalhar em cima da possibilidade de aproximar novamente a natureza do meio urbano e questionar se os usos estabelecidos a partir dessa opressão da natureza poderiam continuar se a mesma tivesse sido tratada de forma menos violenta e opressiva.
Nosso interesse nesse momento é questionar se para o crescimento da cidade era realmente necessário que tratássemos a natureza dessa forma e acabássemos, como no caso dos rios, com 4 mil quilômetros quadrados, dando lugares a ruas e avenidas. A intenção é aprofundar o questionamento: se esses lugares permitiriam as mesmas relações e usos que vemos nos dias de hoje, caso a água ainda fosse presente.
Em uma próxima etapa, o interesse é escolher algumas dessas situações estudadas e propor uma nova leitura e relação da cidade à natureza considerando todo o contexto em que se encontra e como é aproveitado pela população.
2ª Etapa
São os movimentos de subtração e adição que constroem e movem nossos centros urbanos. Essas medidas se intensificam a medida que o homem interfere nos processos naturais.
Percebemos a água como um elementos que expressa em si essa dualidade – o mesmo elemento que negamos no processo de urbanização. Deste modo, se constrói uma série de investigações sobre a formação da cidade de São Paulo a partir da água, o objeto de estudo.
Estendendo o tema para a metodologia de trabalho, buscamos acrescentar possibilidades ao negativo da realidade, ou seja, trabalhar no projeto do que não foi. Pensar a cidade de São Paulo hoje com uma nova infraestrutura fluvial, permitindo os mesmo usos que a configuram, porém sem a opressão dos rios.
O trabalho se desenvolve, portanto, a partir de um vínculo entre realidade e abstração. Um mapeamento geral das águas do município e a pesquisa mais aprofundada de 3 bacias escolhidas como possibilidades de estudo e projeto, dão base para as provocações de como a relação desses espaços com os rios poderia ter sido pensada.
Esperamos que essa leitura do passado e projeção do inexistente nos guie a uma proposição, não menos provocativa, porém mais concreta, no percurso completo de um dos córregos estudados.
3ª Etapa
A água como elemento em constante movimento reflete as relações de adição e subtração que constroem e transformam nossa cidade. Esses mesmos processos, porém, negaram de forma contínua nossos recursos hídricos, subtraindo-os tanto fisicamente (canalizações) quanto subjetivamente (poluição e isolamento) da vivência da cidade.
Após etapas de reflexões, abstrações, estudos e levantamentos, concluiu-se que essa subtração da água não foi essencial para a adição da cidade como ela se constitui atualmente: essas medidas poderiam ter sido balanceadas de outras formas, sem que os usos e características que fazem de São Paulo esse efervescente centro urbano se perdessem.
O Córrego Pacaembu apresentou-se como uma síntese de nossa pesquisa sobre as relações entre a água e a cidade, convergindo todos os temas levantados – piscinão, várzea, córrego aparente, córrego canalizado – em uma extensão controlada, o que permite lidar com o corpo d’água desde seu afloramento até o desague.
Ao mesmo tempo, o Pacaembu percorre três malhas urbanas muito distintas e com usos igualmente diversificados: desde a morfologia orgânica de um assentamento nos moldes de “bairro jardim” planejado pela Cia. City, no qual prevalece o uso residencial unifamiliar de alto padrão, até os grandes lotes industriais na várzea do Rio Tietê, cruzando uma densa área mista e espaços significativos para a vida urbana, como o estádio municipal Paulo Machado de Carvalho, a praça Charles Miller, a avenida Pacaembu e a Fábrica do Samba.
Além de devolver a água à cidade, a intervenção busca colaborar para um processo educacional e de conscientização dos que nela habitam. Um exemplo dessa vontade pode ser percebido na busca que o projeto faz de estabelecer um diálogo entre um Centro de Educação Infantil (CEI) existente na avenida Pacaembu com o ambiente requalificado da mesma.
Desta forma, reconverter o percurso do Córrego Pacaembu se constitui em projetar uma síntese de possibilidades de reaproximação do espaço urbano e daqueles que dele usufruem com a água, possibilidades essas que poderiam servir de exemplo e até mesmo ser incorporadas em outros espaços da cidade, sem maiores alterações nos usos mais expressivos e característicos preexistentes.
4ª Etapa
O crescimento demasiado de São Paulo, no início do século XX, fez com que os cursos d’água cedessem seu espaço a largas avenidas, conforme o desenvolvimento urbano local. O córrego Saracura, localizado no bairro do Bixiga, foi o primeiro a ser coberto, já em 1906. O córrego do Pacaembu, assim como o Saracura, sofreu do mesmo destino quando foi enterrado pela Cia. City nos anos 1920 para a construção do bairro do Pacaembu. O que pouco se sabe é que em algum momento planejou-se dar ao córrego um destino muito mais digno: ele continuaria correndo a céu aberto e alimentaria “bellos lagos artificiaes”, como anunciado pelo jornal Estadão em 03 de janeiro de 1913:
O plano, porém, não foi realizado e a paisagem que se construiu ao longo dos anos foi a mesma que encontramos na maior parte São Paulo – mais de 300 rios, córregos e riachos que correm sob o asfalto.
“Os rios estão enterrados na cabeça das pessoas. Houve um processo educativo que levou a população a achar que os rios enterrados eram melhores. Que possibilitariam o desenvolvimento, evitaria enchentes e mal cheiro”, diz José Bueno, arquiteto e co-fundador da iniciativa Rios e Ruas, que continua, “[…] a cidade foi habituada a viver de costas para o rio. Nossa relação com a água é de medo: medo que haja enchente ou medo de que falte água.”
O distanciamento das águas, imposto pela construção da cidade, subtraiu de nosso cotidiano o elemento que conduziu sua própria ocupação no território. Com objetivo de explorar maneiras de reverter tal processo e encarar a relação entre desenvolvimento urbano e a malha fluvial de maneira mais harmônica, o projeto se aproximou do córrego Pacaembu como objeto de trabalho. Durante toda sua extensão apresenta uma síntese das diferentes maneiras que lidamos com as águas.
O Pacaembu percorre três malhas urbanas muito distintas e com usos igualmente diversificados: desde a morfologia orgânica de um assentamento nos moldes de “bairro jardim” planejado pela Cia. City, no qual prevalece o uso residencial unifamiliar de alto padrão, até os grandes lotes industriais na várzea do Rio Tietê, cruzando uma densa área mista e espaços significativos para a vida urbana, como o estádio municipal Paulo Machado de Carvalho, a praça Charles Miller, a avenida Pacaembu e a Fábrica do Samba.
Nesta ultima etapa, o projeto se aproximou de uma área pontual, que pudesse representar uma síntese do processo do grupo: o delta do córrego Pacaembu, onde pela primeira vez, o córrego encontra a superfície e logo, deságua no rio Tietê. O local abriga o Fórum Criminal Ministro Mário Guimarães e a Fábrica do Samba, bem como a Escola Estadual Canuto do Val e o Arquivo Geral do Tribunal Regional do Trabalho (2ª Região). A importância desse espaço já ocupado por diferentes usos que servem a cidade e que portanto, possuem uma força pública, torna essencial e urgente requalificação da área, trabalhando com as preexistências da área, e desenvolvendo um processo de reeducação e conscientização a respeito do tratamento da água no espaço urbano.
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