“O significado final de qualquer edificação ultrapassa a arquitetura; ele redireciona nossa consciência para o mundo e nossa própria sensação de termos uma identidade e estarmos vivos. A arquitetura significativa faz com que nos sintamos como seres corpóreos e espiritualizados. Na verdade, essa é a grande missão de qualquer arte significativa”.
PALLASMAA, Juhani. Os olhos da Pele
São Paulo, grande metrópole em efervescência. Muitos são os cotidianos e trajetos traçados por seus habitantes dia após dia. Casa, trabalho, estudos, transporte. A vida das pessoas, porém, é marcada na sua rotina pela mesmice do caos e da paisagem urbana de uma São Paulo que não consegue suprir as demandas básicas da população. A pesquisa também visa explorar mais as relações com os edifícios pré-existentes da cidade, e novas opções para cotidianos alternativos serão instigados.
Com o tema do cotidiano em foco, o trabalho visa modificar a paisagem urbana da cidade, podendo assim, aprimorar o cotidiano das pessoas. Um respiro na cidade se mostra necessário, tal como novos espaços urbanos e momentos de lazer para a população, principalmente aqueles que tem um tempo livre escasso. A proposta que será realizada pelo grupo nas próximas etapas visa conciliar mudanças na paisagem urbana em seu aspecto visual e também programático e factual; conectando olhares e usos.
Numa primeira etapa, o grupo explorou os diferentes aspectos visuais que uma cidade pode abarcar, comovendo as pessoas de diferentes formas no seu cotidiano. Um ensaio de contos e imagens sobre cidades fantásticas e reais – baseadas no livro Cidades Invisíveis de Italo Calvino- foi proposto como forma de estudo para o que queremos mudar de fato na cidade. As experimentações propostas a partir de elementos visuais radicais ou palpáveis elucidarão as próximas etapas e decisões do trabalho
Cidade Cinza
Cidade sem Dia
Cidade sem Noite
ENTREGA 2
“Para o cidadão médio, há alguns testes simples que lhe dirão quando passamos do encantamento para a ação prática sobre o meio ambiente. Um deles será a restrição ao uso do automóvel nas grandes cidades. Outro será quando os outdoors, a pior e quase a mais inútil excrescência da civilização industrial, forem removidos das estradas.(…) Meu teste pessoal tem a ver com o posto de gasolina. Trata-se da obra de arquitetura mais repelente dos últimos dois mil anos. Há muito mais deles do que o necessário. Em geral, são imundos. Sua mercadoria é horrivelmente embalada e exposta de modo vulgar. São incontrolavelmente viciados em extensos cordões com bandeirolas rotas penduradas. São protegidos por uma coalizão sinistra de grandes e pequenos empresários. Os postos de gasolina deveriam ser totalmente excluídos da maioria das ruas e estradas. Onde permitidos, deveriam ser sob franquia, para limitar sua quantidade, e deveria haver exigências rígidas quanto à arquitetura, aparência e discrição geral.
Quando começarmos a cuidar disso (e do comércio similar de beira de estrada)
passarei a pensar que somos sérios.”
JOHN KENNETH GALBRAITH
TERCEIRA ETAPA
Na última Banca de EV nos aproximamos do objeto de estudo com o qual pretendemos seguir até o fim do semestre: o Posto de Gasolina
Pensamos, até a última banca, o Posto como um Equipamento de Infraestrutura Urbana; como uma arquitetura marcante na paisagem urbana e presente nos cotidianos de cidades do São Paulo; como objeto dotado de simbologias – do consumismo, do rodoviarismo; e como local que comporta, ainda que não propositalmente ou convencionalmente, certa função pela sociabilizade – os “rolezinhos”.
Passamos, a partir daí, a pensar como intervir nestes locais, levando em conta a quantidade de lotes que ocupam na cidade, a qualidade destes locais enquanto lotes urbanos (muitas vezes grandes lotes de esquinas com três fachadas), o espaço do automóvel na cidade, a escassez de espaços públicos (abertos).
Também passamos a identificar potencialidades na forma arquitetônica adotada nos Posto de Gasolina – que não apresenta grandes variações, pelo menos em São Paulo – e nos tipos de uso/ocupação que ela permite: A permeabilidade do térreo urbano em lotes privados; o acesso livre e sem controle, que lhe dá certo valor de espaço “igualitário” (também em relação aos preços da gasolina e dos produtos da loja de conveniência – tabelados e/ou sem grandes variações); o funcionamento 24hs.
A ideia de projetar um Posto surgiu como mais um instrumento de reflexão sobre este objeto, as parcelas do térreo urbano que este ocupa, e a sub-utilização (ou não) do térreo urbano. Optamos por refazer o desenho de um Posto de Gasolina, repensando suas lógicas e ocupação, seus usos e possíveis apropriações. O Posto deve, para nós, atender distintas demandas, mantendo sua função de abastecimento de automóveis – com outro sistema de funcionamento – que minimize a presença das bombas e automóveis no perímetro coberto pela marquise; mantendo e aprofundando seu caráter público, de acesso livre, aberto e iluminado; e, agora, com mais possibilidades de uso e do espaço.
Do Programa “comum” foi retirado todo comércio voltado para o automóvel, minimizando ainda mais o espaço voltado para o carro. Embaixo da cobertura, o espaço projetado comporta mais usos, sobretudo a possibilidade de permanência. Introduzimos no programa um bicicletário e um vestiário, equipamentos cada vez mais necessários em uma cidade que nos últimos anos começou a rever o privilégio do automóvel no meio urbano.
Débora Filipini, Pedro Medeiros, Rafael Jardim, Ugo Breyton
ETAPA FINAL – POSTO
Chegamos no Posto de Gasolina como objeto de estudo e projeto depois de uma ampla reflexão a cerca da luz como agente configuradora de espaços da cidade, e sobretudo, de usos e apropriações destes.
A ideia de intervir em um posto da cidade partiu da nossa percepção de algumas particularidades destes locais enquanto espaço arquitetônico e da relação deste espaço com a cidade e os cotidianos no urbano: a permeabilidade das calçadas no lote privado; a passagem (uso) pública – irrestrita; e, mais do que isso, a apropriação destes espaços para atividades não previstas – os rolezinhos, sobre os quais nos deparamos com matérias jornalísticas incríveis como a sobre um posto de uma cidade interiorana que havia “recebido” 3000 pessoas em um rolezinho “autônomo”. Essa manchete em questão de certo modo nos remeteu as cidades imaginárias – distópicas (Trelus/Solópolis), desenvolvidas pelo grupo no início do processo, pensando nessa relação entre luz e ocupação do espaço.
A reflexão do grupo passou também por uma análise de um certo valor iconográfico dos Posto de gasolina. Representado por uma série de artistas plásticos como Edward Hopper, Andy Warhol e Edward Ruschas; e parte de um imaginário da cidade e da paisagem moderna – questão esta explorada por Robert Venturi no capítulo X do Aprendendo com Las Vegas. Um símbolo do rodoviarismo, da cultura do automóvel e do consumo.
A proposta de projeto é uma intervenção no lote da esquina da Rua General Jardim com o Minhocão, ocupado por um Posto de Gasolina que não foge muito a tipologia mais comum dos postos da cidade. A ideia é lidar de uma maneira diferente com a ocupação do lote urbano com um posto de gasolina, sobretudo a lógica e a disposição dos espaços para abastecimento/comércio de alimentos e bebidas/ passagem de pedestres / ocupações-usos imprevistos.
O programa (abastecimento de veículos) é mantido no térreo do terreno, realocado e com uma nova lógica funcional.
A verticalização se justifica pela proposta central do projeto: valorizar e potencializar a apropriação do espaço para rolezinhos e/ou atividades diversas (indeterminadas, imprevistas e variantes). Também, que abrigue uma infraestrutura (jardins, banheiros, comedoria, bar, mobiliário móvel – bancos, barracas de feira) que sirva ao entorno e os diferentes cotidianos que se dão na área. Prevemos, inclusive, que parte dessa infraestrutura possa se desvincular do edifício e ocupar (servir de apoio) para atividades desenvolvidas nas ruas circundades e, mais ainda, no minhocão – parque.
A indefinição dos programas de cada piso está relacionada ao caráter híbrido que buscamos dar ao espaço, para que este receba e sirva à usos e atividades varias, que acompanhem as transformações do entorno ao longo de períodos como dia-noite e semana-fim de semana.
Do posto de gasolina “tradicional” permanece a iluminação e o funcionamento 24hs, o referencial luminoso na paisagem da cidade, a permeabilidade de todo o perímetro do terreno, a presença pequena de fechamentos (recuados) e o fluxo e presença de pedestres e automóveis.
ENTREGA 4
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