G21 | O Hall

Equipe: Adriana Porto Alegre, Beatriz Dias, Luisa Teperman, Fernanda Vaidergorn e Marina Schiesari

Orientador: Thiago Benucci

quarta etapa | contos que cabem no hall

A quarta e última etapa foi o momento de refinamento e consolidação da produção literária. O grupo se dedicou a revisar os textos já produzidos e escrever novos, assim como desenvolver a parte gráfica com o objetivo de chegar a um produto final completo. O livro contos que cabem no hall reune um conjunto de 24 contos produzidos ao longo do semestre.

O livro completo pode ser acessado pelo link: https://issuu.com/grupo21_estudiovertical/docs/contos_que_cabem_no_hall

edição final do livro contos que cabem no hall

terceira etapa

Identificando no texto inicial do caderno produzido para a etapa anterior uma potencialidade, o grupo decidiu dar continuidade ao trabalho e as análises sobre o hall de edíficos residenciais burgueses através da linguagem literária. Nesta terceira etapa o grupo se dedicou a produzir uma coletânea de crônicas tendo o hall como espaço-personagem.

A literatura é uma maneira de registrar e transmitir sensações, reflexões, angústias, acontecimento e relações que podem se estabelecer em situações e espaços. Tendo como base os estudos feitos para a etapa anterior, as crônicas produzidas desejam transmitir ao leitores as inúmeras possibilidades de relações que o espaço do hall é capaz de abraçar.

A seguir, estão apresentadas três das quatorze crônicas produzidas que formaram a primeira edição do livro: algumas cônicas sobre o hall

1O minutinhos

Minha mãe me deixou ficar sozinha em casa. Já faz muito tempo que peço para ela me deixar ficar sozinha, mas ela falava que eu era muito nova. Mas ontem eu fiz seis anos e meio. Minha mãe sempre fala que ninguém comemora os meio anos. Mas agora que tenho seis anos e meio sou muito mais velha que uma menina de seis anos. Então minha mãe deixou eu ficar em casa enquanto ela vai pro mercado. Até agora tá tudo bem, nao sei porque ela tava preocupada.

Ela já saiu a cinco minutos, pelo menos eu acho que foram cinco minutos, eu acabei de ganhar um relógio de ponteiros da barbie e estou aprendendo a ler as horas ainda. Tá agora já passaram dez minutos minha mãe falou que voltaria em dez minutinhos então ela já deveria ter voltado, mas ela não voltou, acho que to vendo as horas do jeito certo, meu vô falou que toda vez que o braço da barbie mexesse é porque passou um minuto e o braço já mexeu dez vezes então já passaram dez minutos. Será que to olhando pro braço certo lembro que tinha um braço que era dos minutos e outro que era das horas

será que já passaram dez horas cadê minha mãe acho que vou lá fora talvez tenha algum adulto no hall não tem ninguém aqui na verdade nunca tem ninguém só tem minha porta de casa e do meu vizinho meu vizinho ele é adulto como ele chama mesmo eu nao conheço muito ele será que vou falar com o meu vizinho ou ele é um estranho porque minha mãe sempre fala pra eu nao falar com estranhos então acho que eu não devia falar com ele mas ao mesmo tempo pode ter acontecido alguma coisa com ela e eu vou ficar aqui sozinha para sempre acho que eu devia ir falar com meu vizinho 

Minha mãe chegou.

Chaves

Finalmente em casa. Procuro pelas minhas chaves, reviro minha bolsa incessantemente. Foram dez minutos mergulhando minhas mãos em cada centímetro da desordenada bolsa e então desisto. Toco a campainha e nada, ela ainda não chegou. Recosto-me na parede ao lado da porta para aguardar e aos poucos vou escorregando até que por fim sento-me no assoalho. O espaço é suficiente para que apoiando minhas costas na parede eu possa esticar minhas pernas. Penso no sofá que está a cerca de um metro do meu corpo, cujo alcance é impedido por uma porta de cor monótona e formato igualmente sem graça. A medida que os minutos vão passando os incômodos vão crescendo. Desenrosco a bolsa do meu corpo e a coloco de lado, em seguida tiro os meus tênis. Aquele casaco que estava na cintura já passou para trás do meu pescoço para tornar-se uma almofada improvisada. Se foi a primeira hora e a meia-calça se transforma em uma espécie de espartilho apertando meu estômago. Tiro a meia calça. Escorrego um pouco mais até que minha cabeça apoiada no casaco inclina-se para o teto e eu passo a observar cada canto do espaço. A porta do lado oposto é da mesma monotonia, exceto pela maçaneta em outro formato que consegue ser ainda mais sem graça. Buscando conforto me viro de lado apoiando agora minha cabeça nas minhas mãos enquanto dobro meus joelhos para que eu possa me encaixar no espaço e começo a folhear o jornal que me foi dado na saída do metrô. Após passar pela sessão de esporte e culinária, me envolvo em uma matéria sobre um diretor que está prestes a estrear uma nova peça de teatro com tema polêmico. Ouço então o barulho do elevador. Ufa! Olho para cima e meu rosto cora no mesmo instante.”Pois é, esqueci minhas chaves “Eu sou sua vizinha. Muito Prazer.” Digo enquanto me ponho de pé em um segundo e ao mesmo tempo chuto todos os objetos estranhos ao espaço para o canto na esperança de que eles desapareçam. Após os comprimentos a outra porta se fecha e agora o conforto jamais será atingido novamente.

Não morrem

Fico o dia todo aqui. Todo dia o dia todo. 

Passam, não me tocam. Param, não me olham. 

Carregam similares a mim, porém nos braços. Vejo estas nos braços prontas para serem entregues. 

Elas – sempre vivas – parecem usar das mais belas vestimentas, das terras mais distantes. Chegam cheias de graça, prontas pra animar o dia mais triste de alguém, facilitar a melhora de um doente ou até mesmo sintetizar um sentimento não falado. São parabéns, melhoras ou te amo. 

E eu? Sou escolhida pra parecer elas porém sou durável – ™o melhor custo benefício∫ – não demando energia. É isso que dizem. 

Até esquecem de mim. Quando reparam, se perguntam ™sempre esteve aqui? é viva ou morta?∫,∫É de plástico ou verdadeira?∫ 

Eu também sou de verdade! Acham que não me machuca esse tipo de pergunta, afinal não posso murchar – não morro! 

Fico ali delicada fazendo “a indiferente”

Não sou indiferente! 

Eu sei, não devia me iludir e achar que a vida delas é perfeita, nenhuma é… Mas fingem bem. Aquelas pétalas vibrantes respingando os resquícios de água do último vaso, o embrulho de papel fino e amassável, o gesto de serem exibidas pelos outros. Passam e impactam. Fico tentada em ter uma vida e se viva, viver assim. 

Felizmente essa simpatia não precisa durar muito. Sorte delas, pelo menos elas vão, são recebidas, frequentam, se despedem e deixam de existir. Nem viva e nem morta, não abastecida e mal agradecida,  sei o que faço no hall: vivo minha inacabável crise existencial. 


segunda etapa

“Você viu?”. Eu não tinha visto. “Eu troquei os quadros para mudar a paisagem”. Eu realmente não tinha visto. Ninguém tinha. Fui reparar no quadro que ela estava falando. Vermelho. Não sei qual tinha antes dele. O quadro combina com a parede, tão vermelha quanto. Sentei na poltrona.

Estranho pensar no espaço do Hall de entrada. As vezes me pego pensando nas transformações que aconteceram e como um ambiente pode ser modificado. Não sei se param para pensar na história desse lugar, se é um lugar de história. Agora digo que sim, tem muita história. Talvez tenhamos que voltar um pouco no tempo. Me pergunto até onde na história preciso voltar… talvez pensem que eu voltei demais. Mas sentado agora, nessa poltrona, acho que tenho tempo para pensar.

Hall… Hall não é nem português! Como veio parar aqui? e quando veio parar aqui? Acho que o melhor jeito de descobrir daonde veio, seria pelas informações que temos: o nome.

Voltemos, então, para a época medieval inglesa… considero que aqui foi onde tudo começou. O hall era o ambiente oficial, servia como divisor entre o mundo externo e o espaço privado. Além da transição clássica, que sempre esteve presente como função desse espaço, o aposento demarcava a vida pública dentro do ambiente doméstico. As atividades que ali aconteciam estavam diretamente atreladas às relações de poder, por conta de ser um ambiente onde o representante era visto pelo povo; na chegada da corte, nos momentos de reivindicações e festividades.

Desse modo, começamos a história desse recinto com uma importância oficial e pública da monarquia; um jeito de mostrar seu domínio frente aos vassalos e inimigos. Precisava mostrar importância e imponência, garantindo um lugar grandioso, o fato de estar localizado, na maioria das vezes, em regiões de clima temperado, significava, também, um espaço de abrigo com suas lareiras e paredes grossas.

Pensamos, agora, como esse ideário arquitetônico foi repassado e reinterpretado para os países colonizados pelos ingleses. O american way of life possibilitou a ressignificação do hall, mas para uma vida doméstica mais comum e principalmente privada. Esse abriga casacos de frio e chuva, sapatos e introduz os convidados previamente selecionados a sua residência. Americanizado e globalizado, o hall muda seu sentido pela legitimação do bens privados, ou seja, invés de ser uma área impositiva simbolicamente se torna impositiva visualmente.

Qual o valor desse quadro vermelho combinando com a parede vermelha? Ele foi escolhido por alguma razão. Mas por que ela se orgulhou disso? Estamos no brasil, right?

No brasil, cuja política sempre flertou com as práticas neoliberais e globalistas dos Estados Unidos, inconscientemente – ou não – incorporou o hall de entrada como referência estética. Assim como no modelo americano, é possível ver esse espaço em diversos estabelecimentos, sendo unifamiliares, multifamiliares e até comerciais.

Esse aposento, mesmo com atividades reduzidas, se manteve presente na vida ao longo de todos esses anos, tão presente que na maioria das vezes não paramos para reparar nele. A forma como conhecemos o Hall hoje, ao invés de se tratar da casa do representante da comunidade, abriu a possibilidade de dar poder ao próprio ”host”- que, ao receber, também está apresentando sua posse a partir de seus regimentos.

O hall de fato se efetivou como um ambiente inevitável no cotidiano burguês.

Devia sentar mais aqui.

Manual de como decorar seu hall

Os halls íntimos ou halls de entrada – como é popularmente conhecido o espaço entre o elevador e o apartamento – são ambientes cheios de informação.

Nesse recinto cuja metragem em média não passa de 2m quadrados, há sequências intermináveis de elementos milimetricamente posicionados ou seriam depositados?

São infinitas categorias e formas de transformar esse espaço e as simbologias que são transmitidas são inúmeras.

Esse manual pretende de maneira fácil e em uma linguagem acessível ao contexto decorativo te guiar por diversas possibilidades de transformação desse espaço, levando sempre em consideração as mensagens que poderão ser passadas.

Ele se configura também como guia de imersão no universo do hall burguês paulistano. As imagens que acompanham os textos são fotografias de halls fornecidas por amigos das integrantes desse grupo de trabalho. Eles estão localizados em sua maioria nos bairros centrais da cidade de São Paulo: Jardins, Higienópolis, Vila Madalena, Barra Funda entre outros.

página do caderno “O Hall”

primeira etapa

seleção de halls residenciais
imagens retiradas do google

Considerando o espaço do hall como banal, incômodo e cotidiano, o grupo pretende fazer uma análise de caráter pessoal desse espaço.
Olhando sob a ótica da influência dos padrões comportamentais na arquitetura, o grupo atuará em um primeiro momento como observador através da produção de relatos, fotografias e desenhos de observação para tentar responder questões que possam nos levar à compreensão desse espaço.
Como ele se caracteriza?; Quem ocupa?; Como ocupa?; Onde está?; Quais seus tipos?; Quais os padrões comportamentais previstos?; etc…
Em paralelo pretende-se elaborar um embasamento e discussão teóricas arquitetônicas e simbólicas do espaço. Como referências bibliográficas foram levantadas a princípio autores como Rem Koolhaas e Marc Augé.

Hall comercial.
Imagens tiradas do trabalho: Omer Fast Martin-Gropius-Bau.
Talking is not always the solution. design espacial: Studio Miessen