G29 | O Refúgio em Ocupações de São Paulo

“Brasileiro, estrangeiro… somos todos refugiados, refugiados da falta dos nossos direitos.”

Carmen da Silva Ferreira  

(Líder do FLM e coordenadora da ocupação Cambridge)

O Refúgio em Ocupações de São Paulo
O Caso do Edifício do INSS 
(Ocupação 9 de Julho)
Entende-se por “arquitetura eventual” um meio responsivo a um período de tempo determinado. Sob a ótica do recorte do Centro da cidade de São Paulo, este conceito de arquitetura eventual pode ser extendido de forma que se desdobre sobre os refugiados que são, oficial e não-oficialmente, recebidos pela cidade; Sob os refugiados, sob o período de refúgio e sua qualificação.
Tomando partido da Convenção das Nações Unidas, entende-se que não importa a temporalidade ou situação de um refugiado, o indivíduo que busca refúgio deve ter direito e ser inserido em ciclos/círculos de Habitação, Educação, Lazer e Economia.

 

“A Convenção deve ser aplicada sem discriminação por raça, religião, sexo e país de origem. Além disso, estabelece cláusulas consideradas essenciais às quais nenhuma objeção deve ser feita. Entre essas cláusulas, incluem-se a definição do termo “refugiado” e o chamado princípio de non-refoulement (“não-devolução”), o qual define que nenhum país deve expulsar ou “devolver” (refouler) um refugiado, contra a vontade do mesmo, em quaisquer ocasiões, para um território onde ele ou ela sofra perseguição. Ainda, estabelece providências para a disponibilização de documentos, incluindo documentos de viagem específicos para refugiados na forma de um “passaporte”.

      Convenção das Nações Unidas, Resolução n. 429 V

Dentro do recorte selecionado, observa-se um grande déficit em relação a capacidade de acolhimento e o número de refugiados recebidos, exponencialmente em ascensão. Fato este que imediatamente se relaciona com outra peculiaridade de São Paulo – os espaços vazios e movimentos de ocupação, que se tornam um potencial para suprir o déficit identificado.
Ao conciliar estes fatores, acreditamos que é possível qualificar um edifício ocupado dando maior importância à atividades econômicas, culturais e de lazer, como uma uma tentativa de integrar o estrangeiro com as dinâmicas de convivência paulista.
O edifício de abandonado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), mais conhecido como ocupação 9 de Julho, apresenta iniciativas alinhadas com os conceitos explicitados, desde o desenvolvimento de atividades econômicas com a implementação de uma padaria e restaurante, residências artísticas para estudantes estrangeiros, a ocupação conta com um número significante de habitantes refugiados, tornando-se então o objeto de trabalho do grupo.

térreo perspectivado do prédio da ocupação 9 de julho, realizado para a 11a bienal
3a etapa

 

 

 

 

 

 

 

O que é o Eventual dentro da Arquitetura? O que é a Arquitetura Eventual?

Estas são questões levantadas neste trabalho que teve início no começo deste semestre. Com os conflitos mundiais que enfrentamos há tempos e até os dias de hoje, é inevitável não pensar nos refugiados e nos conflitos que surgem a partir dos deslocamentos, eventuais, em um primeiro entendimento. Todas as “refugee cities” criadas pelo mundo, sem prazo de validade, nos fez questionar a eventualidade e a efemeridade da situação do refugiado.

Ao tratar o tema do refúgio através de uma arquitetura eventual, pode-se pensar acerca da qualificação deste período de refúgio e nas fronteiras construídas, sendo estas físicas ou não. Em qualquer mudança de país, o choque cultural será uma dessas barreiras a serem enfrentadas, assim como a inserção social, compreendida principalmente nas quatro macroáreas: econômica, educacional, habitacional e de lazer, que deveriam ser garantidas mesmo em estado de refúgio.

Ao aproximar o tema do refúgio para a cidade de São Paulo, tornando estas questões mais palpáveis, a análise indica que existe um grande déficit em relação a capacidade de acolhimento do número crescente de refugiados. E que a capacidade de acolhimento não é minimamente equivalente a inserção social e econômica.

Diferente de países europeus ou mesmo do continente africano, a cidade de São Paulo não conta com grandes infraestruturas para recepcionar refugiados. Por sua vez, estes são distribuídos dentre abrigos do Governo, ONGs, entidades religiosas e até mesmo edifícios ocupados por movimentos de luta por moradia.

E é no último ponto que o estudo se baseia. Através da luta pela moradia encontrada em São Paulo, ocupando edifícios abandonados, entender como tal ambiente pode proporcionar também ao refugiado habitação, educação, lazer e economia.

O recorte do centro de São Paulo deve ser considerado com suas características específicas e peculiaridades. Destas, talvez uma das mais importantes para análise seja o histórico dos espaços vazios e dos movimentos de ocupação.

Ainda estudando a potencialidade das ocupações para a inserção dos refugiados, encontramos que este modelo já é de certa forma seguido, de maneira diferente, na ocupação 9 de julho, fazendo com que esta se torne o objeto de estudo, não só pelas atividades realizadas, mas também pelo número significativo de moradores refugiados.

Outro fator decisivo para a escolha do recorte foi a descoberta de uma reunião semanal de refugiados que acontece na ocupação 9 de julho, o GRIST (grupo de refugiados e imigrantes sem teto).

  • A partir de agora mudo a entonação do texto para um caráter mais pessoal, devido a proximidade estabelecida com o objeto de estudo e as experiências proporcionadas pelo mesmo.

Participamos de quatro reuniões que, por mais que tinham a mesma “base”, se mostraram muito diferentes devido aos temas abordados. Optamos por fazer relatos de todos esses encontros (os mesmos se encontram disponíveis na íntegra aqui), que se mostraram como objeto de estudo muito ricos para a síntese de conceitos abordados. Além de entendermos minimamente os conflitos, entramos em contato com refugiados que já moram na ocupação e outros que se interessam por ingressar.

Depois de entendermos os objetivos dos encontros e nos familiarizarmos com aqueles que participam de tal cenário, pretendemos aprofundar na compreensão das dinâmicas de convívio intrínsecas a ocupação 9 de julho especialmente relações de conflito entre moradores imigrantes e brasileiros.

4a etapa

O refúgio em São Paulo

A aproximação ao tema do refúgio especificamente em São Paulo se dá através dos possíveis desdobramentos de uma investigação acerca de um novo entendimento para o termo arquitetura eventual, diferente daquele cunhado por Bernard Tschumi (1994, p. xx): “(…)there is no architecture without event, without program, without violence(…)” – Arquitetura esta que se entende como responsável por tratar e qualificar o período de refúgio na vida de um ser humano.

Para tal, se estabelecem diretrizes cujas prerrogativas seriam garantir componentes chave para a inserção social e minimização de choques culturais, como o acesso a Habitação, Educação, Lazer e Economia.

Esta análise verifica a existência de um grande déficit em relação a capacidade de acolhimento e inserção social de um número em constante crescimento de refugiados .

Diferente de países europeus ou mesmo do continente africano, a cidade de São Paulo não conta com grandes infraestruturas para recepcionar refugiados. Por sua vez, estes são distribuídos dentre abrigos do Governo, ONGs, entidades religiosas e até mesmo edifícios ocupados por movimentos de luta por moradia.

O refúgio nas ocupações de São Paulo: O caso do edifício do INSS

O recorte do centro de São Paulo deve ser considerado com suas características específicas e peculiaridades. Destas, talvez uma das mais importantes para análise, seja o histórico dos espaços vazios e dos movimentos de ocupação.

Esta peculiaridade se apresenta como um potencial para suprir o déficit existente de acolhida de refugiados na cidade de São Paulo.

Ao conciliar os dois fatores, acredita-se possível a qualificação de um edifício ocupado atividades econômicas, culturais e de lazer, em uma tentativa de integrar o estrangeiro com as dinâmicas de convivência paulista.

Este modelo já é de certa forma seguido, de maneira diferente, no edifício ocupado de propriedade do INSS na avenida nove de julho, fazendo com que esta se torne o objeto de estudo, não só pelas atividades realizadas, mas também pelo número significativo de moradores refugiados.

A Pesquisa

Inicialmente o grupo se aproxima da ocupação através das reuniões do GRIST (Grupo de Refugiados e Imigrantes Sem Teto), onde, introduzidos por Eliane Caffé, se inicia um processo de tomar conhecimento da estrutura do próprio grupo, organização do Movimento, moradores e refugiados que aguardam vagas para se juntarem as ocupações do Centro de São Paulo.

Com o mote mostrar, não contar (show, don’t tell) a estratégia escolhida para identificar pontos considerados chave sobre o conflito entre os moradores da ocupação estrangeiros e brasileiros, toma-se uso de relatos de campo, que poderão evidenciar sutilezas por vezes não expressas através da linguagem verbal, buscando compilar todas as informações obtidas através dos levantamentos de campo e explicitar todas as ocorrências intrínsecas a ocupação nove de julho durante o período de levantamento, sempre mostrando uma mesma história através de cinco diferentes pontos de vista, criando ainda um banco de dados sobre as situações do cotidiano encontradas.