G37- Mungunzá e a Luz

MUNGUNZÁ 1

Teatro de Contêineres – Cia. de Teatro Mungunzá

Entrega 01:

A partir da problematização iniciada pelos debates da primeira semana, o grupo se propôs a entender e enfatizar a questão de que não se ocupa com cultura, essa não se traduz por algo que se utiliza eventualmente para fins específicos, como se fosse um objeto. Entendendo que a cultura está em todas as esferas da nossa vida – mesmo que haja um esforço em desassociar seu conceito e prática da maioria da população, alçando-a ao status de intangível sem capital econômico – se concluiu que se ocupa, justamente, através da cultura, de forma a estreitar distâncias para com a sociedade e a mesma.

Dessa forma, num contexto do bairro da Luz, muito próximo ao “fluxo” da “cracolândia” a Cia. Mungunzá de Teatro ocupou o terreno entre as ruas dos Gusmões, dos Protestantes e General Couto de Magalhães, o qual estava na iminência de receber um empreendimento privado e multimilionário – para a empreiteira que iria realizá-lo-, entre as estações da Luz e Júlio Prestes. E nesse sentido vem se legitimando como ocupação cultural vias diálogo com a população, além das ações de aproximação como a ocorrida no último sábado (25/08) de oferecer cuidados, café da manhã e recreação infantil para moradores da região, além de estar sempre aberta com o seu “playground” para as crianças do bairro. A forma como a qual se estabeleceu no espaço parte de uma ideia de se manter a materialidade existente pré-Teatro de Contêineres, sendo que se manteve todas as lajes concretadas do terreno e a partir delas se levantou o teatro, um palco com domo geodésico, a quadra de futebol e o playground.

A questão da Companhia e a aproximação da cultura, enquanto conceito de produzir, conhecer e aprender, para com a população e as crianças em específico acontece mediante uma leitura muito sensível das dinâmicas da Luz – a quadra por exemplo, foi instituída após uma série de vezes crianças virem para jogar em um dos espaços concretados, assim, foram colocados os gols, pintaram as linhas e construíram a arquibancada. Desse modo, o nosso trabalho se coloca como tomar coro dessa leitura do espaço, entender suas práticas e demandas com as crianças e moradores, e a baseados nisso auxiliar no que for possível nesse diálogo.

Ocupação é estar presente, e uma Ocupação Cultural, torna presente a cultura.

 

Entrega 02: Análise e estratégia

No segundo semestre de 2016, numa construção durante a madrugada, a companhia Mungunzá de teatro ocupou o terreno que tinha sido temporariamente concedido a ela. O espaço foi inaugurado em março de 2017, e apenas dia 30 de agosto de 2018, a ocupação foi oficialmente legalizada.

Para a escolha do local, foi feito um mapeamento de terrenos públicos na região central que estivessem sem uso ou sem finalidade pública plausível, a partir disso foi proposto uma parceria público-privada com a prefeitura para que o terreno pudesse ser concedido para o grupo por um período curto. A ideia inicialmente era de um projeto de três anos para desenvolvimento, e a partir disso descobrir através dos moradores da região se tal intervenção atua de forma benéfica ou não para os mesmos.

O teatro se localiza em um entorno ambíguo, este que é ao mesmo tempo evitado por parcela da população por conta dos usuários de droga, gera interesse por ser um espaço com diversos pontos culturais. O bairro do bom retiro, por exemplo, que se localiza ao norte do terreno do teatro contêiner, é repleto de museus, escolas, teatros, entre outros. Entretanto, esses ambientes muitas vezes funcionam de forma excludente e intimidadora para os moradores da região.

A proposta da companhia é fazer o espaço cultural ser integrador e acessível, e coloca em prática de forma que as peças que não são gratuitas para todos, sejam pelo menos para os moradores da região. Além disso, a lanchonete atua através a proposta de “pague quanto achar justo”.

O funcionamento do teatro contêiner a princípio se dava exclusivamente pelo grupo da cia mungunzá, com seu núcleo formado por sete pessoas. Entretanto, moradores e trabalhadores da região começaram a se envolver com projetos, contando com a apropriação e intervenção das pessoas da comunidade local. De tal forma, o terreno público se encontra em constante processo de transformação. Um exemplo disso é um morador da região, chamado Fábio, que construiu uma horta comunitária no terreno, e hoje se responsabiliza por diversas intervenções no espaço.

O prédio que se encontra no mesmo terreno já foi negociado com a prefeitura como uma escola de artes para crianças, e ele abrigará artistas que em troca do espaço terão que dispor 1 hora de sua semana para ensiná-las. Assim como a escola trará outros significados e investimentos ao espaço, o fato de a ocupação ter se tornado legal também influencia, mesmo que antes de tal acontecimento a companhia já houvesse ganhado o prêmio Shell de teatro pela categoria Inovação, e recebido investimento da lei rouanet.

As crianças que frequentam o terreno em geral moram na região, muitas das mesmas se encontram em situação de rua ou são moradoras de ocupações próximas, entre elas a Ocupação Mauá, que conta com aproximadamente 235 famílias e se encontra no entorno imediato. De todo modo, os espaços de brincar delas é quase inexistente nesse contexto.

A intenção da companhia com o espaço é também tentar fazer dele sustentável. Além da utilização de água de reuso, a própria estrutura de contêiner é de reutilizada, os onze contêineres comprados no porto de santos não serviam mais para navegação. Até mesmo a intervenção externa que transforma barris em brinquedos para crianças foi feito para eles pelo coletivo Bazurama que trabalha com lixo e reciclagem.

Os pontos de iluminação artificial de todo o terreno foram doados por um coletivo chamado Armazém da Luz, e a manutenção do local como um todo ocorre pela própria equipe da cia e dos grupos vinculados a eles.

A partir do estudo e análise do local, surgem propostas de intervenções práticas e pontuais, mas também projetos futuros com a tentativa de melhorar os espaços que estão sendo subutilizados, proporcionando um diagrama de fluxos mais coerente a partir de alteração da entrada principal do terreno e da entrada para a futura escola.

Essa primeira, que se localiza no meio do terreno, se encontraria em um lugar de passagem mais frequente para quem está indo a pé do metrô para o teatro. O espaço que se encontra atrás da geodésica seria transformado em uma praça pública, e a entrada se daria através da praça, tornando o ambiente mais funcional e convidativo.

Para fácil acesso do terreno para o prédio, a companhia abriu uma pequena porta próxima a uma região também subutilizada. Para haver um fluxo exclusivo para a escola sem atravessar o terreno do teatro, a parte de trás do terreno se transformaria também em um ambiente público, criando o diálogo necessário entre as duas construções, porém respeitando seus diferentes usos e espaços.

As intervenções mais práticas, por sua vez, têm como objetivo suprir as demandas atuais do local, com a construção de uma cozinha coletiva ao ar livre, a reforma da quadrinha de futebol, a construção de gols para a mesma, a potencialização dos brinquedos do Bazurama, e a construção de um balanço/arquibancada que ficará suspenso através dos galhos de árvores pré-existentes.

 

Entrega 03

Depois de apontarmos nossas possíveis intervenções, elaboramos um plano de ações para a etapa final, tendo em vista nossa limitação econômica e material, e expondo pontos de potencialidade de acordo com as análises realizadas pelo grupo.

Decidimos começar com a parte 1:1 do projeto, e para isso tivemos que estudar o local de intervenção mais a fundo, que seria entre as árvores pré-existentes e nas proximidades da quadrinha, e a partir disso começar a construir a plataforma flutuante desejada para o local.

Escolhemos trabalhar com madeira e construir a plataforma com a medida de 2,2m x 1m, de forma que em ambos os lados entre o balanço e as árvores ainda sobre um espaço de pouco menos de 2 metros. A mesma fica suspensa e exerce movimentos por conta de duas cordas multifilamentos que são presas em troncos firmes e espessos das árvores.

As diferentes possibilidades de uso, as direções e velocidade que a plataforma balança também é de extrema importância, tendo em vista uma a preocupação existente para a forma como crianças podem se machucar ao brincar nela ou próximo a ela, para isso colocaremos um piso de um material diferente em cima da madeira, de forma que este dê mais estabilidade, e arredondaremos as quinas e as protegeremos com borrachas.

Além disso, a plataforma fica a aproximadamente 50cm do chão, encontrando um equilíbrio de altura para que a mesma possa ser utilizada de banco para adultos e para que as possíveis quedas das crianças que usufruem da mesma como brinquedo não sejam de distâncias muito grandes.

Uma próxima intervenção seria resultante de análises baseado num evento que visitamos no teatro. Organizado por um grupo que atua em parecia com a cia. Mungunzá, eram realizados cortes de cabelo na geodesia e oficinas de brincadeiras com crianças da região. Ao mesmo tempo, um som alto tocava enquanto alguns integrantes jogavam bola e pegavam comidas de uma mesa de plástico que fora colocada ali apenas para tal evento.

Em geral, ao vivenciar isso, o ambiente como um todo se mostrou muito propicio para a construção de uma área de cozinha ao ar livre, possibilitando churrascos e uma área maior para preparo de comidas. Para isso, pensamos no espaço como um balcão-bar, este seria fixo e contaria com uma churrasqueira instalada ao seu lado; mesas pré-existentes seriam melhores posicionadas de forma que houvesse uma conexão entre a cozinha antiga e a nova ao ar livre, porém sem que se forme uma barreira para a passagem.

Entrega 04

O intuito inicial do grupo de realizar intervenções nas três parte do terreno infelizmente se mostrou inviável por conta dos recursos financeiros e tempo disponível, de tal forma que as intervenções não realizadas tiveram que ser colocadas como intenções projetuais. Para melhor estudo e intervenção no terreno, este foi dividido em três áreas.

A designada como área A, além de dar espaço a nova cozinha externa, também passa a abrigar a nova entrada principal, priorizando o fluxo realizado por pedestres que se dirigem ao teatro através do metrô e pontos de ônibus. Essa alteração se dá através do recuo das grades de forma que as mesmas permeiem a geodésica, o espaço atualmente subutilizado se tornaria uma praça pública com um longo banco e um jardim que concede certa privacidade e distancia para a entrada, ao mesmo tempo que a torna acolhedora sem interromper possíveis fluxos de quem atravessa tal esquina.

A parte do terreno que sofreu intervenções do grupo durante o semestre foi denominada área B, esta recebe uma atenção especial e maior necessidade realização prática pois é possivelmente o único espaço de brincar das crianças da região. As intenções projetuais da mesma contam com a alteração de pisos e um enforque maior para a área ser destinada estritamente para o uso infantil, tendo em vista que essa passará a exercer o papel de pátio para as crianças que utilizarão do prédio que se encontra no fim do terreno após a inauguração do mesmo.

 

A partir da demanda supracitada de gols para a quadrinha pré-existente, construímos o mesmo com as dimensões de 1,5m por 1m, e sua rede a partir de nylon.

Realizamos a instalação temporária da plataforma em um horário que não houvesse crianças no local de forma que fosse possível visualizar na prática e testar os possíveis problemas e acidentes que pudessem ser causados pela intervenção. Nos preocupamos com a proximidade de um dos pilares de concreto responsáveis por segurar a grade que cerca o terreno, havendo uma possibilidade de choque entre ele e um usuário da plataforma dependendo da possível queda do mesmo. Para maior segurança, tal pilar foi envolto por uma camada de E.V.A em toda sua área localizada dentro do terreno.

Ao ficar de pé na plataforma enquanto a mesma se encontrava em movimento, foi apontado um segundo risco de segurança, uma vez que o piso de compensado tratado se mostrava muito escorregadio e não havia locais para se segurar, dificultando a brincadeira e a tornando mais perigosa. Nossa solução foi envolver todo o compensado com um piso de borracha texturizado, e instalar uma corda a 1 metro e meio acima da plataforma, sendo uma distância pensada para que crianças de diferentes alturas pudessem acessa-la com os braços esticados e ao mesmo tempo adultos também conseguissem usar de apoio sem ter que se abaixar.

Como já planejado, protetores de quina foram instalados nos encontros entre as quinas do compensado e seus apoios, juntamente com “espaguetes” de piscina que envolvem as cordas laterais do balanço.

A terceira área, denominada por C, foi a mais problemática para a idealização projetual pois atualmente é utilizada para carga e descarga durante as peças e manutenção, e se encontra vazia e subutilizada em todo o restante do tempo. Esta também é responsável pela única entrada atual do prédio, a antiga entrada principal foi fechada e essa fora aberta pela própria companhia para que houvesse uma circulação estritamente interna. Para que fosse possível abranger todos os usos atuais trazendo uma convivência mais harmônica com o terreno, separamos tal área em duas, de forma que metade da mesma realizasse o papel exclusivamente para manutenção, carga e descarga, enquanto a outra metade atua com um diálogo direto a área B, trazendo espaços para lazer.

As três áreas contam com uma nova disposição de pisos e vegetação para que haja maior recuo da cidade nas áreas necessárias, porém sem que haja uma ruptura sonora e visual tão significativa entre o teatro e o meio no qual esse está inserido, tendo em vista que para os atores é de extrema importância que haja diálogo através do eixo que cruza o contêiner principal, que destinado para os espetáculos, em suas partes envidraçadas e as ruas do entorno. A intenção é que o espaço atue como espaço de acolhimento, cultura e lazer para os moradores da região. O terreno é público e deve ser pensado pelo e para o povo, principalmente por se mostrar em tal contexto de extrema sensibilidade, nosso preceito é justamente não o tornar apenas mais um oásis cultural e vegetativo ilusório e excludente da cidade.